‘A crescente participação de jovens na política é o que nos devolve a esperança de um Brasil melhor’, diz Fernando Aguiar

Adolescentes de 16 e 17 anos votam de forma facultativa,  este ano houve grande mobilização para incentivar voto

Fernando Lima

Com a chegada do período eleitoral, o Jornal Verdade traz na sua edição de hoje, uma entrevista com Fernando Aguiar de Freitas, ele é advogado Especialista em Direito Eleitoral; Presidente da Comissão de Direito Eleitoral da 13a Subseção da OAB/SP; além de Membro Efetivo da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político e Membro do Observatório de Direito Eleitoral da ABRADEP.

Na entrevista, Freitas destacou pontos que considera fundamentais na Legislação Eleitoral, além da importância da participação dos jovens na política. Aguiar ainda pontuou sobre questionamentos que estão sendo feitos contra as urnas eletrônicas.

Confira a entrevista:

A Legislação Eleitoral mudou muito nos últimos anos. Quais pontos considera principais dessa mudança?

O direito eleitoral é uma ciência viva, que está em constante mutação. Quem milita no eleitoral bem sabe que pisamos em verdadeiro terreno movediço. A seara eleitoral é uma área que possui contornos bem específicos, notadamente, pelo fato de que os legisladores, que são deputados e senadores, elaboram toda a normatização legislativa que eles próprios se submeterão na próxima eleição. Criam as regras do jogo que irão disputar. Portanto, é absolutamente comum e esperado uma minirreforma legislativa a cada dois anos, fazendo ajustes na legislação eleitoral, criando ou suprimindo institutos que foram bons ou ruins segundo a experiência da eleição passada. Não é só a legislação eleitoral que passa por mudanças, a própria estrutura da justiça eleitoral favorece a constante volatilidade dos entendimentos jurisprudenciais. Os Juízes Eleitorais servem à Justiça Eleitoral por apenas dois anos ou até dois biênios consecutivos. Isso faz com que os entendimentos estejam em constante modificação, gerando muita insegurança jurídica. Destaco como ponto positivo dessas mudanças, a evolução do arcabouço legislativo instituído para fomentar a participação política da mulher. A participação política da mulher é um assunto que interessa a todos os gêneros. Não há como construir e consolidar a democracia sem a verdadeira e efetiva paridade de gêneros. Esse é um grande desafio para a sociedade brasileira, primada pelo patriarcado que está arraigado na cultura social e política do país. Grandes avanços foram verificados, mas está longe da plenitude e do ideal da participação política da mulher. Outro ponto que destaco é o grande desafio legislativo e institucional do combate à Fake News. É crime previsto no Código Eleitoral, em seu artigo 323, com redação dada pela Lei nº. 14.192, de 2021. Os Tribunais Eleitorais estão empenhados no combate à Fake News, mas o controle da produção e circulação de notícias falsas é muito difícil.

No seu ponto de vista, estas mudanças tornaram o processo eleitoral melhor ou pior?

Essas mudanças têm o objetivo de tornar mais forte nosso regime democrático. A consolidação da democracia não é um processo estanque, ao contrário, é um processo sistêmico, produto do longevo e constante aperfeiçoamento da legislação, das instituições democráticas e dos próprios eleitores, que passam, cada vez mais, a se informarem e se politizarem. Mas, a pedra angular onde repousa, estrutura e alicerça toda a solidez do regime democrático sempre foi o eleitor. É por essa razão que as instituições democráticas têm empenhado esforços na informação do eleitorado. É um processo complexo que, certamente, envolve investimento em educação. A educação e a informação são as armas mais eficazes contra as Fake News, que será a grande vilã dessas eleições. O eleitor informado está preparado para o enfrentamento desse mal tão pernicioso ao processo eleitoral. Em termos do processo eleitoral, agora relativo aos procedimentos previstos na lei eleitoral, aguardamos ainda a aprovação do novo Código Eleitoral, que fará uma compilação de toda a legislação esparsa e são muitas leis espalhadas!!!

Esse ano existe uma polarização ainda mais ferrenha, diferente daquelas que vivemos em eleições anteriores. Qual o seu ponto de vista sobre isso?

A Constituição Federal, prevê em seu artigo 1º, inciso V, o pluralismo político, que assegura, justamente, esse embate de ideias, de diferentes ideologias e conceitos. Esse debate é justo e muito saudável para o fortalecimento do processo democrático. A ciência jurídica se aprimora pelo debate e confronto de ideias. É pelo debate, pelo confronto de ideologias diametralmente opostas que se criam grandes ideias. Ocorre que, no campo eleitoral, há muito tempo se perdeu a ideologia partidária. A maioria dos(as) candidatos(as) não conhecem ou conhecem muito pouco da ideologia, da história e dos fundamentos dos partidos aos quais são filiados. Muda-se constantemente de partido, sem critérios lógicos. Não vejo com bons olhos a polarização política, da maneira como está se descortinando nesse pleito. Está perdendo a racionalidade, o bom senso e, sobretudo, o respeito. Não está se levantando argumentos, está se levantando bandeiras!!! A cada pensamento exposto levantam-se bandeiras contra e não contra-argumentos. Tem preferência o ódio ao debate e isso não bom.

Recentemente as urnas foram questionadas até mesmo pelo presidente da República. Como enxerga tudo isso?

Na verdade as urnas eletrônicas sempre foram alvos de ataques, basta a proximidade das eleições!! A urna eletrônica representa uma das maiores conquistas da sociedade brasileira. A Justiça Eleitoral está vocacionada à tecnologia. Uma curiosidade, que poucos sabem, esse ideal de tecnologia do voto já estava presente no Código Eleitoral de 1932, aprovado pelo então Decreto-Lei nº. 21.076, de 24 de fevereiro de 1932, que em seu artigo 58, § 15º, utilizava a expressão “máquina de votar”, dizendo, “Nas secções eleitorais onde se use a máquina de votar, serão observadas essas regras: a) o voto é dado na máquina, dispensando-se a cédula;” Não existia ainda um protótipo de urna. A ideia da urna eletrônica vem do anseio de solucionar ou diminuir nosso grande problema no processo eleitoral, que sempre foi a intervenção humana. Verificavam-se inúmeras modalidades de expedientes fraudulentos e a necessidade de desenvolver um sistema que garantisse a lisura e idoneidade do pleito era grande e urgente. As urnas eletrônicas, são seguras e auditáveis, é uma tecnologia que está em constante evolução!!! Existem vários mecanismos de fiscalização dos sistemas eleitorais, a Resolução TSE nº. 23.673/2021, trouxe inovações nessa área. Existem testes de integridade das urnas eletrônicas, testes de autenticidade dos sistemas eleitorais, zerézima, votos em backup, votação com identificação biométrica do eleitor, entre outros. Precisamos sempre aprimorar, jamais voltar ao arcaico e fraudulento sistema de cédulas. Os questionamentos sempre existiram e fazem parte dessa construção democrática, no entanto, nunca trouxeram qualquer fato concreto que pudesse demonstrar fraude nas votações. Os detratores das urnas eletrônicas dizem que “se o sistema fosse seguro aquele tal país teria adotado urna eletrônica”. Talvez não tenham se questionado se a máxima intervenção humana no processo eleitoral daquele país era um problema, era motivo de inúmeras fraudes. Eu costumo responder com um questionamento: Qual o motivo de nosso país não despontar na tecnologia de fabricação de máquinas para retirada de neve das ruas?? E logo respondo, porque neve, nunca foi nosso problema.

Os jovens de 16 e 17 anos votam de forma facultativa, mas este ano houve uma mobilização para que eles tirassem o título e votassem. Qual a importância dessa participação?

A crescente participação de jovens na política é o que nos devolve a esperança de um Brasil melhor. Esse fato prova que o processo democrático está em constante movimentação. Precisamos do engajamento político desses jovens eleitores, o mais urgente possível. O jovem eleitor é questionador e isso é ótimo na política. A maior participação desses jovens eleitores reflete o grau de desenvolvimento social, mas ainda estamos longe do que seria ideal. A participação política do jovem está muito atrelada à educação e informação, aliás política e a educação é um casal que jamais poderia se divorciar.