Politicamente constrangido e acuado diante do mau desempenho nas pesquisas de intenção de voto, que apontam chance maiores de vitória para Lula (PT) ainda em primeiro turno, o presidente Jair Bolsonaro (PL) e seus aliados tentam emplacar nesta quinta-feira (30), no Senado, um combo de benefícios que buscam aliviar a relação com as bases populares por meio de um aumento nos valores do programa Auxílio Brasil e do auxílio-gás.
Também está a caminho o programa Auxílio Caminheiro, uma novidade que vem a reboque da crise gerada pela alta do diesel e dos combustíveis em geral, um dos motores da impopularidade de Bolsonaro.
Chamada nos bastidores do Congresso Nacional de “pacote de bondades”, a medida está formatada em um relatório produzido pelo senador governista Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), que reuniu no documento trechos das Propostas de Emenda Constitucional 1/2022 e 16/2022. As duas tramitam juntas e o texto agora é apelidado de “PEC dos Combustíveis”.
A ideia do texto é que o Auxílio Brasil salte de R$ 400 para R$ 600, o auxílio-gás seja alterado de R$ 50 para R$ 120 e que o voucher dos caminhoneiros tenha fatias de R$ 1 mil mensais para a categoria. Por ter vindo à tona somente nas prévias do pleito de outubro, o pacote chamou a atenção no ambiente político e ganhou a pecha de “eleitoreiro”.
A diretora de relações institucionais da Rede Brasileira de Renda Básica, Paola Loureiro Carvalho, ressalta que especialistas, movimentos populares e entidades civis do segmento mais progressista vinham demandando auxílios mais robustos para a população “há bastante tempo”.
“Fico muito triste em saber que isso só é pauta para o governo como estratégia eleitoral porque os R$ 600, pra nós, são um tema desde a pandemia, tanto que lutamos por ele. Nós lutamos pelos R$ 600, pela cota para mães solo, lutamos pela permanência dos R$ 600 quando o governo baixou pra R$ 300 e lutamos pra que, em 2021, o benefício continuasse sendo esse, e não houve nenhuma inflexão por parte do governo pra repensar esses valores”, relembra.
Especialistas vinham se queixando não somente dos baixos valores do Auxílio Brasil, mas também de uma série de problemas, como é o caso do freio dado pela gestão Bolsonaro à entrada de novas famílias no programa.
Com o agravamento constante da crise socioeconômica e os altos índices de desemprego e miséria, é grande a procura pelo benefício. O líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho, tem falado em “zerar a fila de espera”, mas uma associação entre os números da PEC e a realidade do atual cenário socioeconômico geram dúvidas sobre essa possibilidade.
Dados oficiais do Ministério das Cidades divulgados pela Folha de S. Paulo na última terça (28) apontam para uma fila de 764,5 mil famílias consideradas habilitadas a participar do programa que estavam à espera de vaga em maio deste ano.
A estatística, no entanto, contrasta com números levantados pela Confederação Nacional dos Municípios (CFM), cujo levantamento mostra que havia 2,7 milhões de famílias aguardando vaga no mês de abril. Esse montante está bem acima do total de famílias que podem ser atendidas pela política se o Legislativo der sinal verde para a PEC dos Combustíveis, que prevê atendimento a mais 1,6 milhão de famílias.
A proposta do governo é começar a pagar as parcelas do pacote em 1º de agosto, com cinco fatias fixas que terminariam em dezembro deste ano. A curta vida do benefício vai de encontro ao que tem sido historicamente proposto por especialistas que demandam a criação de uma renda básica, benefício de caráter permanente que possa assistir pessoas em situação mais vulnerável no país.
“Mas isso não tem nada a ver com o que o governo Bolsonaro está propondo nessa PEC, que é eleitoreira, é a instrumentalização da necessidade do povo, da pobreza, por objetivos eleitorais”, pondera José Antonio Moroni, da Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político.
Teto de Gastos
As verbas que irão financiar o pacote ficarão fora do Teto de Gastos, o ajuste fiscal que vigora desde o governo Temer (MDB) e é duramente criticado desde antes de sua aprovação pelo Congresso Nacional. Em seus três anos e meio de gestão até agora, Bolsonaro foi pressionado em diversos momentos pela oposição e pela sociedade civil organizada do campo progressista a rever a política, mas o governo manteve a vigência do teto.
“O teto aniquilou a política de assistência social, a saúde, a educação, tirou direitos da população brasileira e, agora, aos 45 segundos do segundo tempo, Bolsonaro se sente autorizado a ter um cheque em branco por parte do Congresso pra finalmente enxergar que vivemos uma situação de emergência, e aí passar a beneficiar as pessoas com um valor maior” critica Paola.
“É antidemocrático, inclusive, esse movimento que ele vem fazendo e um desrespeito à luta por uma política de transferência de renda digna que a gente vem fazendo há muitos anos e que fizemos muito na pandemia em cima dos valores pelos quais a gente lutou”, encerra.
Trâmite
Para ser validada, a PEC 1/2022 precisa ser aprovada pelas duas casas legislativas do Congresso em dois turnos diferentes de votação. Assim, caso receba aval do Senado, seguirá para avaliação dos deputados.
Edição: Rodrigo Durão Coelho